terça-feira, 27 de fevereiro de 2007

O ontem e o hoje

O virar da página parece sempre tão simples. Só que a página, que pertence a um lugar dentro de um livro, entre umas e outras tantas páginas, não é de todo volátil. Fica escrita, maktub, no inconsciente da literatura de uma vida.

Um dia acreditei que a minha energia interior lutava por si própria ao encontro da página certa, da palavra que suplantava a vontade humana gritando-se a si própria. Um dia flutuei entre essas palavras esquecendo-me dos lugares, das pessoas, da complexidade que nos une a todos num mesmo destino sem verdadeiro fim. Usava-me como luta por verdadeiros e poderosos ideais ingénuos, deixava que a emoção tomasse conta de mim para me fazer chegar ao alto da montanha e, sem dar por nada, me deixar cair sem medo de não me erguer. Enterrava-me na dor para descobrir a fraqueza que me tornaria mais forte. Lembrava-me de mexer os dedos e cheirar as flores como se fosse a primeira vez e de parar, para sentir. Sabia o que era o instante feliz, a lágrima sorridente, o olhar de fascínio perdido num horizonte do amanhecer. Era dona do sim e do não e do porquê que eu própria escolhia. Era eu.

Hoje nada mais sou do que uma sombra envelhecida pela urgência de viver. Vivi sem parar, vivi tudo, vivi. E o que fiz de mim?