sábado, 24 de janeiro de 2009

O Escafandro e a Borboleta

Talvez assim volte a escrever,
Num impulso vindo de uma pálpebra que mexe ao som de cada letra,
Numa memória que se transforma em fantasia absurda,
Num fumo que desenha lábios de vinho no céu.

Talvez assim volte a escrever,
A acariciar o vento com o olhar,
A atravessar uma cascata de cores,
A sentir um dedo do pé que chega e toca no meu,
E que não sabe mais para onde ir.

Vou escrever-te
Até que a saudade seja nostalgia sem vontade
Até que apague cada sílaba do teu nome
E que de ti só reste tudo o que não conheci.

Vou escrever-te
Para borrar os lábios,
Para olhar,
Para descobrir, afinal, tudo.

Enquanto o abcedário tocar.

sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

A todos os que nos deixaram em 2008

Se eu morrer, sobrevive a mim com tamanha força
Que acordarás as fúrias do pálido e do frio,
De sul a sul, ergue teus olhos indeléveis,
De sol a sol sonha através de tua boca cantante.
Não quero que tua risada ou teus passos hesitem.
Não quero que minha herança de alegria morra.
Não me chames. Estou ausente.
Vive em minha ausência como em uma casa.
A ausência é uma casa tão rápida
Que dentro passarás pelas paredes
E pendurarás quadros no ar.
A ausência é uma casa tão transparente
Que eu, morto,te verei,vivendo,
E se sofreres, meu amor,
Eu morrerei novamente.

PABLO NERUDA