terça-feira, 28 de janeiro de 2014

A Última Esperança do nosso Magalhães

Passaram-se quatro dias, dois dos quais estive totalmente incontactável. Chegar ao fim do mundo tem destas coisas, quanto mais ao fim se quer ir, mais se sente na pele o que implica esse fim que nunca acaba, mas que impede o contacto com o mundo. Cheguei de avião a Punta Arenas e logo senti a força incrível do vento e o quão próximo está o céu da terra, recortada por um mar imenso chamado Magalhães. Sim o nosso, mas que chegou aqui ao serviço do rei de Espanha. Deu o nome a tudo: Patagónia vem de um livro publicado no século XVI que descrevia seres humanos gigantes como patagonos; Pacífico, o nome que deu ao oceano que atravessou, vem das águas calmas que cruzou assim que passou a Terra do Fogo; e por fim Terra do Fogo porque nesta região viam-se os fogos das casas das populaçoes indígenas. Como seria de imaginar ninguém faz ideia aqui que Magalhães era português: o seu nome foi totalmente espanholizado para Magallanes e está em todas as ruas de todas as povoaçoes e cidades do Chile. Mas é espanhol.


De Punta Arenas atravessei parte da Patagónia para chegar a Puerto Natales na província da Última Esperança, a pequena cidade banhada por um lago de onde já se avistam as primeiras montanhas do parque nacional Torres del Paine. 
No dia seguinte mais uma viagem de três horas para chegar a Laguna Amarga, uma das entradas do parque, depois de passar por guanacos, nandus, baqueanos (os cowboys cá do sítio) e muitas vacas e carneiros. Paisagens a perder de vista, a cordilheira dos Andes a mostrar a sua força, as montanhas cobertas de glaciares e eu a saber que ia ter os dois dias mais isolados da minha viagem. Passei-os a andar, a fazer os primeiros verdadeiros trekkings da vida. 









 No primeiro dia foram 7 horas de caminhada na montanha para chegar até ao ponto mais próximo das Torres del Paine, não cheguei ao fim mas todo o processo mental que a caminhada provocou em mim tornou esta experiência verdadeiramente iniciática. Passo após passo, o tempo deixa de ter uma duraçao e pura e simplesmente acompanha a paisagem numa perspectiva psicológica e não numérica. Os pensamentos deixam de ser seguidos e tornam-se fluídos, ao ritmo das passadas e dos desafios. Todo o mundo que a mim me pertence desapareceu ao longo destas muitas horas. Até...encontrar um grupo de portugueses pelo caminho. E, em meia hora apenas, estar a falar de cinema português em plena Patagónia. 
 No dia seguinte, após uma viagem de autocarro e da travessia do lago Pehoé de catamaran, cheguei a Paine Grande, ponto de partida para o trekking com destino ao Glaciar Grey, a 3 horas e meia de distância. Juntei-me a um grupo de americanas para esta caminhada (devo dizer que foi mais um momento de positividade total com americanos ao longo desta viagem). Caminhámos sob uma chuva torrencial, ventos glaciares, terra totalmente molhada e sem desistir, chegámos. E pela primeira vez na vida observei o azul tão azul que os glaciares reflectem por baixo da camada branca. Um glaciar com 12 metros de altura que segundo dizem nao é assim tão impressionante. A mim impressionou-me mesmo. Olhar para o que podia ser mar, o que podiam ser ondas, e ver tudo parado, como se de uma fotografia se tratasse, é extasiante. Mais três horas e meia de caminhada à chuva e ao vento e uma noite dormida com chuva e vento numa tenda de campismo terminaram com a minha energia para caminhar. Confirmo: Torres del Paine é mesmo a 8ª Maravilha do Mundo. 

p.s. se conseguir, já incluo mais fotografias. Estas foram tiradas com o telemóvel. 



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